O ASILO

O ASILO
Por Paulo Rebelo

Atendi um idoso acompanhado do filho. Ambos eram bem apessoados, mas estranhamente colocavam-se distantes um do outro, mesmo estando lado a lado. Não pareciam estar brigados. Falavam pouco. A impressão que me passavam era que não tinham o que conversar; não tinham nada em comum.

Durante a consulta, o velho nada dizia e o rapaz era reticente. Motivo: me pedia um laudo sobre as condições clínicas do pai. A família pretendia levá-lo para o asilo de idosos.

Aquilo me chamou atenção. Isso não é incomum, mas pessoalmente, nunca tinha visto isso. A princípio, achei estranho. Perguntei-me: por que? Como mandar um pai para o asilo?! Percebendo o meu ar de surpresa, como que para justificar tal ato, o rapaz apressou-se para contar a seguinte história:

A sua família não queria saber daquele homem que havia abandonado a esposa e filhos na miséria há mais de quarenta anos. Saiu de casa por causa de uma outra mulher com quem constituíra uma nova família.

Durante décadas nunca mais se ouvira falar daquele homem e assim mãe e filhos viveram a sós e unidos. A mulher assumiu o papel de pai e mãe e se virou como pôde para dar sustento ao que sobrara da família. Ela os criou bem e “formou” todos eles.

Uma bela tarde de domingo, um táxi para na porta da casa do rapaz e desce um velho homem já debilitado que dizia para ele que estava voltando para casa. Estranhamento total de todos.

Apenas a ex-esposa o reconheceu. Surpresos, nenhum dos filhos sabia quem era aquele estranho, mas a velha senhora sim; teve um colapso nervoso e em meio a essa confusão geral, souberam quem ele era. Revolta e incredulidade.

Agora o velho era quem havia sido abandonado pela segunda família e ele, não tendo para onde ir, resolveu voltar para casa que julgava ser ainda sua.

A família do rapaz, constrangida e indignada com esse acontecimento, tendo em vista que sua mãe estava igualmente idosa e enferma, tomou a decisão de deixá-lo em sua casa enquanto providenciava que ele fosse embora dali para o asilo o quanto antes.

Assim foi feito.

Um dia comentei com minha mãe (80 a) o que ela achava dos filhos de terem mandado o velho pai para o asilo. Para fazer suspense, contei-lhe apenas metade da história.

Cenho cerrado, desnecessário dizer o quanto ficou injuriada, dizendo-me: “jamais façam isso com o pai de vocês ou comigo”. Será o meu fim!”

Ao saber de tudo, surpresa, inicialmente, calou-se para depois dizer de peito cheio: “sabe de uma coisa, meu filho, ele mereceu isso!”
😉😉😉

Paulo Rebelo, o médico poeta

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