EU A VI!*

Eu a vi!

Às vezes, já completamente absorto em seus pensamentos, num estado quase onírico, ele se perguntava a todo instante se aquele belo ser que imaginava ter visto outro dia poderia ser, de fato, real ou fruto de mais um de seus loucos sonhos; de qual estrela ela teria caído? Ou seria ela a própria estrela?

Certa noite fria, arrebatado por aquela visão que o atormentava, imaginou ser ele um dos Reis Magos e que, realmente, vira uma linda estrela cadente no firmamento. Guiado por forte emoção, pôs-se a caminhar apressadamente ao seu encontro, na longa noite adentro. Imaginou estar com ela, mas… Dizer-lhe exatamente o quê? Que ele estaria amando ou por ela encantado? Que gostaria que dele fosse, ela, sua propriedade eterna? E se não tivesse a coragem de dizê-lo, o seu olhar seria capaz de transmitir-lhe a intensidade e forma de tudo o que sentia por ela? Ela o entenderia? Queria tocá-la com suas próprias mãos, acariciar densa e suavemente seu rosto por um breve momento, apenas, para materializá-la para sempre dentro de si. Ela o rejeitaria? Enfim, o que fazer se ela nem sequer o conhecia?! Por um instante, ficou aflito e inseguro. Confuso, perdeu a voz. Seus olhos marejaram.

Acordou transpirando frio, mas seu corpo ardia e como brasa. Com o coração palpitando a mil, faltou-lhe o ar, fugiu a luz. Imaginou ser o seu fim. Era mais um sonho, enfim. Aliviado, sob pálidos traços de lucidez, vagamente sorrindo para si mesmo, se deu conta de que uma imagem tão real ou imaginária, daquela mulher tão bela, não era para ser posse sua jamais, mas para ser contemplada e sentida infinitamente, como quem respira o ar para continuar vivo, pois ela não só pertencia à beleza radiante do mundo como ela mesma era a própria, o ponto alto da sua criação; o mundo se expressava e se completava através daquele ser tão lindo e puro… Assim, amá-la-ia dessa forma, resignou-se ele, pois se a aprisionasse em seu coração, na ou em sua mente, como incontáveis vezes assim ardentemente o desejou, para toda a eternidade, pensou ele, ela perderia o viço; o mundo, cor e graça. Ele, também, por fim, definharia.

Então, compreendendo a grandeza e a razão da existência daquela bela criatura, indelevelmente marcado por ela, ambos finalmente livres e ele, agora em paz, tomado por um imenso e transbordante contentamento daquele tipo impossível de ser humanamente contido, disse bem alto e confiante para si e para todo o universo ouvir- “Acreditem todos, eu a vi e a amei! Não foi um sonho!”.

Paulo Rebelo

 

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