AMIGO*  

 

Alô, meu amigo,
há quanto tempo!
Perdão pelo adiantado da hora,
de estar te mandando essa mensagem
de texto assim tão tarde da noite,
no meio da madrugada,
sequer esperando a aurora.
Palavras aflitas,
meio apressadas,
meio confusas,

perdidas,
desajeitadas.

Sinto-me estranho.
Isso não é normal.
Preciso te dizer;
Tenho tido medos,
desses de tudo um pouco,
que vão se acumulando,
que vão me corroendo,

Desidratando
oxidando aos poucos,

comendo-me pela beirada,
aquela pouca esperança
ou apenas o que resta minguado dela,
a luz da vela tremeluzindo da lufada de ar entre porta semiaberta!

Parece loucura.

Na verdade,

espero que estejas dormindo profundamente
para que não me vejas assim,
tão aflito,
para que não te assustes
nem te preocupes tanto comigo,
além de tuas próprias preocupações,
pelo que tenho a te dizer.
Vai passar!

E, se por ventura,
estiveres acordado mesmo no meio da noite,
que não estejas desperto o bastante para escutar-me de todo,

se é que seja possível me escutar nos sonhos
Pois, saiba não quero que me vejas acabrunhado,
No fundo, esse não seria EU,
um arremedo de mim,
se apossando de mim.

Sinto-me fora do eixo,
fora do tempo
e espaço,
deslocado!

Às vezes, nem eu mais sei separar sentimento de pensamento .
Todavia,
sei que tenho lutado muito com todas minhas forças.
Assim, em muitas derrotas não tive culpa nenhuma,

acredite!

No fundo,
eu gostaria de estar dormindo em paz;
não mais consigo!
É que roda gigante, no sobe e desce,
no vem e vai das marés.
Só DEUS sabe!

Não gostaria de ir à igreja ou ao templo,
nem ao psicólogo nem à cartomante,
quando ainda tenho um amigo com quem possa falar.
Não quero perder o juízo!

Imagina, falar disso para estranhos…
Para lhes derramar minhas dores?
Descobrir lhes minhas fraquezas,
minhas elisões morais,
meus pecados venais?
Uma vergonha;
seria o fundo do poço.
Seria como pagar pelos serviços de uma acompanhante,
tomar um ansiolítico,
um antidepressivo que me desse paz
no escapismo, mas ilusões…
Não!

Isso é tão densamente humano.


Só de teres a calma para escutar,
a paciência para me aturar,
a força para me sustentar,
a vontade para me ajudar nessa minha aflição,
sei que me compreendes.
Agora já me sinto aliviado.

Assim, muito obrigado, meu amigo!

Bom descanso.

 

Paulo Rebelo, o médico poeta.

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