A NOTÍCIA*
A NOTÍCIA
Eu estava de plantão numa pequena clínica num bairro de classe média alta. Era um domingo de céu nublado e manhã fria de 12°c. Aproveitei o momento para estudar.
Tudo ia bem até que a secretária fez entrar no consultório dois senhores na casa dos 45 anos, sendo que um deles, aflito, dizia a seguinte história para me em seguida me fazer um pedido inusitado; ele precisa dizer para os pais que o irmão mais novo estava morto, vítima de grave acidente automobilístico na madrugada daquele domingo.
Para preparar para o pior, ele havia dito à família que o irmão estava sendo submetido a uma cirurgia de urgência e que estava grave. O problema é que ele insistia para que EU desse a notícia do falecimento de rapaz, indo até a casa de seus pais.
A minha resposta imediata foi não. Todavia, chorando muito, beirando o completo desamparo, insistia para que aceitasse o seu pedido. Ele estava muito preocupado com a reação da saúde dos pais já idosos.
Após negar muito e depois ponderar, aceitei ir até lá com a condição de que a notícia fosse dada por ele mesmo ou alguém da família e eu estaria lá para atendê-los. E assim ficou acertado.
A casa, um amplo bangalô de cor cinza, ocupava um terreno de quase meio quarteirão e com muro alto. A escadaria demonstrava suntuosidade. A porta parecia um portal.
Já no imenso hall, todos me olharam assustados. Sim, eu era o médico. Pensaram: “o que estaria fazendo lá naquela situação?”
Perguntei ao homem: “tu contaste o que aconteceu?” Ele disse baixinho: “sim”.
Amparado pelas filhas os velhos pais vieram ao meu encontro e me abraçaram angustiados, mas com ternura e com um forte sotaque árabe me perguntaram: “doutor, doutor, que passa meu menino?”
E eu, empático e inocentemente disse-lhes alto e firme: “meus pêsames, eu lamento muito que aconteceu com o seu filho”. Arregalaram os olhos, ouviram-se gritos de espanto e desespero. A velha senhora desmaiou na minha frente.
E eu, surpreso, naquele momento me dei conta de que EU era quem havia dado a notícia do falecimento do jovem rapaz.
Paulo Rebelo, o jovem médico.