A INSATISFAÇÃO*
Ah!
Essa inquietude
Ainda há de me matar um dia.
É uma ebulição
Que me coze aos poucos,
Um “esfriviamento”,
Uma comichão
Que não acaba nunca,
Uma eterna insatisfação.
Pois estou sempre com fome
E a camisa, de tão apertada,
Nunca me cai bem.
Nunca estou pronto;
Sempre me falta um pedaço,
Uma incompletude,
Um estado perene
De inacabamento
De minha alma,
Que parece querer estar
Em todo lugar,
Mas não de estar
Em lugar nenhum.
Se estou aqui,
tenho que ir embora,
Se estou lá,
Tenho que voltar;
Ficar nunca;
Agitar é minha sina,
Quando, muitas vezes,
Desejei apenas o silêncio
E sossegar.
Assim sou eu:
Um vazio a ser preenchido,
Um tempo a ser consumido.
Paulo Rebelo, o médico poeta.