A GRATIDÃO DE UM MÉDICO*
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A GRATIDÃO DE UM MÉDICO.
Ao longo de 40 anos exercendo a medicina, já atendi alguns milhares de pessoas, acredite. Parece exagero, mas é a mais pura verdade. A maioria, se a visse, perdão, não me lembraria de seus rostos, quiça de seus nomes. São desconhecidos. Uma pena.
A cada consulta, de algum modo, me empenho para que eu marque suas vidas indelevelmente e como uma folha em branco, sem demagogia, me deixo ser marcado por elas, pois faço desse encontro minha poesia.
Às vezes, grosso modo, o consultório se parece como um teatro onde o médico encena seriamente uma peça de cunho vital à ambos, para encantar individualmente cada um da plateia e muitos não se apercebem da magia daquele belo momento. Mas, a vida é assim mesmo. Apenas deixa marca no peito o que nos toca sensivelmente.
É que muitos, sem se dar conta, parecem se esforçar para passarem por nós todos como anônimos, no caso, numa relação médico paciente, frequentemente, equidistantes, quando este, nos tempos de modernidade passou a ser chamado de “cliente” e não mais “paciente”, símbolo de uma relação meramente comercial.
De alguns, tenho a estranha sensação de “dejá vu”. Entre tanta gente, ainda que transcorram vários anos, de muitas me recordaria na hora; entre essas, digo-te como toda franqueza, algumas me marcaram profundamente, a tal ponto de buscá-las como exemplos para mim. A partir delas, passei a refletir sobre a difícil condição humana e seu destino, porquanto, o meu próprio, até eu mesmo ter mudado como pessoa, sem que tenham me dito uma única palavra sequer, nem elas imaginado que, diante do bem ou do mal advindo daquele interessante ou intenso caso clínico, poderiam me influenciar positivamente para o resto de minha vida.
À essas pessoas, muitas já idas para o outro plano, agradeço-lhes profundamente por terem me feito, acima do médico, um homem sensivelmente melhor.
Paulo Rebelo, o médico poeta.