A DESPEDIDA*
A DESPEDIDA
Crônica por Paulo Rebelo
O médico já nem mais se perturbava com o seu estranho poder: a premonição.
Dizia para os mais íntimos que duas coisas curiosas lhe ocorriam sempre; a primeira quando pensava em alguém que há muito tempo não vinha ao seu consultório e então, PAH! Em seguida, como se enviada por Deus, lá a pessoa lhe aparecia, uma ou duas semanas depois; a segunda e mais desconcertante e impressionante ainda era a sua capacidade de prever a morte, quando pressentia q o indivíduo que lhe visitava iria desencarnar e nada podia fazer por ela, a não ser orar. Isso lhe ocorria com certa regularidade.
O interessante é q o médico não era um homem religioso nem espírita, místico nem esotérico, porém era ser humano sensível aos dramas alheios, portanto profundamente espiritualista.
Brincava dizendo que isso lhe seria mais útil se pudesse adivinhar os números da loteria.
Um dia comum de trabalho, lá aparece um paciente seu de longa data, cujo diagnóstico há quase dez anos era de intupimento das artérias do coração, confirmado por cateterismo cardíaco. Era uma caso cirúrgico para “ponte de safena”. O mesmo médico havia acertado no diagnóstico e o paciente desconfiado, ouviu uma segunda opinião; isso foi confirmado por dois outros médicos.
Como o paciente não sentia absolutamente nada ou assim dizia, levava a sua vida normalmente, esquecendo-se do problema.
“Ah! O pobre homem veio se despedir de mim”, pensou o médico. Conversaram amenidades, essas coisas entre amigos, examinou normalmente o paciente. De fato, estava assintomático. Mas, não se deixou iludir; “ele vai partir”, arrepiou-se o médico.
“Doutor, estou lhe achando um pouco diferente. O senhor está vendo alguma coisa em mim? Nao me esconda nada! Eu estou pior, né?” Perguntou o paciente.
“Nada disso! Deixe de conversa, homem!”, respondeu-lhe. “É só o prazer em lhe rever depois de tantos anos, sabendo da seriedade de teu problema e caboclo, cá para nós; tu deves estar com a mais alta cota com Papai do Céu!”
“Vamos operar?”, perguntou-lhe o médico. “Doutor, se não sinto nada, por que iria operar o meu coração? Sorriu, o paciente.
Desolado e resignado o médico não mais insistiu.
Algumas semanas depois, sabendo de tudo desde o início, agradecida pelo empenho e amizade dedicados há vários anos ao ente querido, a familia do paciente veio avisar ao médico que ele havia partido; teve morte súbita, enquanto serenamente dormia.
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Paulo Rebelo, o médico vidente.
É interessante a forma que vc conduz os seus textos baseados em experiências do seu cotidiano.
DEYVERSON, tu que frequentas o consultório de minha família há vários anos, ali é um rico celeiro de experiência humanas t´tão reais que parecem as nossas próprias. É de lá que extraio a minha escrita literária.