A CHUVA E O MENINO*

A CHUVA E O MENINO

Amanhecia,
eu ainda sonhava
quando a chuva que chove despertou
e sem avisar desabou dos céus,
silenciando os até os pássaros que começavam a gorgear.

Caiu sobre a cidade,
em cima do telhado,
na copa das árvores,
provocando o som do choveio* que me acordou,
mas que fez agasalhar-me ainda mais debaixo dos lençóis e sonhar acordado.

Trouxe lembranças de minha doce infância quando durante o aguaceiro jogava bola,
apanhava manga nadava nos canais pluviais de Belem do Pará e com pueril travessura,
com meus amiguinhos, saia a apertar a campainhas das casas do quarteirão inteiro da Brás de Aguiar.

“Saia já da chuva, menino!”, ao longe dizia minha mãe.
O pedido da chuva era mais forte.
Era com se me dissesse: “aproveite, garoto, esse tempo não voltará mais”.

Foi durante a chuva que Jandira,
serelepe,
um ano mais velha do que eu,
aproveitando a minha inocência,
empolgada,
me beijou e beijou-me com sua boca,
relembro agora carnosa,
tépida e molhada pela água daquela chuva fria da tarde úmida de inverno amazônico, cujo gosto e aroma do beijo que passara a ser meu,
guardo como um inestimável tesouro dentro de mim.

Ah, meu primeiro beijo! Um beijo que despertou em mim o homem que dentro do menino estava latente,
cuja chuva é a minha única testemunha, lhes juro, e agora volta para me dizer isso.

Paulo Rebelo, o escrevente do tempo.

*CHOVEIO-palavra que criei na cabeça para tentar descrever o doce ruído da chuva.

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