A VOLTA POR CIMA*
A VOLTA POR CIMA
Acontece um fracasso
Dos muitos desde tenra idade
Até próximo da maturidade,
Do tipo súbito como raio e trovão,
inesperado como uma explosão
Que nos dilacera em mil pedaços,
Em meio a certa desídia
Ou mesmo soberba confiança,
rebeldia.
Um tipo de fracasso desde sempre desconsiderado,
Que parece não ter ocorrido,
Que sequer se cogitou termos contribuído para isso,
Mas que se ainda juntar os estilhaços,
Remendar cacos,
Sairemos ilesos.
Isso é próprio da eterna juventude,
aventureira e irresponsável,
Quando perder não é nem lição de vida.
Pode-se errar e abusar; o desperdício de tempo é atividade lúdica.
É como fazer parte de um treino
Quando, se quiser,
O jogador terá muitas outras chances,
Parecendo vídeo game.
E perder não faz diferença alguma,
Pois a ele a vida é uma brincadeira.
E se há acidentes, as feridas cicatrizam da noite para ao dia como se jamais houvera existido.
O tempo não existe.
Dessa feita, as preocupações passam ao largo da vida
Como sempre célere e silente
Ora calma ora ardente.
De altos e baixos,
como na montanha russa,
Sobram emoções,
Como fazer rafting nas águas turbulentas correndo à jusante
Inexorável
Sedutora,
Envolvente.
Delirante!
Eis que um dia, porém,
Sem avisar,
o vento muda de direção,
soprando que nem tufão
O homem outrora altivo, garbo e audaz,
Depois de tempos,
Dos campos de batalha,
De lá volta ele sorumbático,
cabisbaixo e arredio,
mortalmente ferido.
Sua alma imersa no crepúsculo da noite profunda.
O que parecia ser atividade lúdica,
às vezes, brincadeiras até de mau gosto,
Tornaram-se jogos mortais.
Aí surgiram as primeiras perdas reais,
reviravoltas,
fracassos.
a incredulidade,
o desalento,
as dificuldades.
Ocorre que de luta em luta,
muitos foram tombando pelo caminho.
Incontáveis vezes, o homem se viu sozinho,
pois a essa altura da vida,
Lamenta-se, agora é tarde, muito foi perdido;
pois, agora a regra é não haver regra nenhuma.
Estar no ringue à própria sorte,
lutando como um leão ferido.
Foi jurado de morte.
Antes o ATLAS carregando o mundo sobre os ombros,
agora ele o empurra montanha acima que nem PIRRO.
A sua frágil arma é a sua consciência açodada pela ventania fria e inclemente,
cujos seus outrora sólidos fundamentos já não subscrevem nada.
Pela primeira vez o medo de sofrer,
de passar despercebido.
o medo de morrer,
o medo de ser esquecido num lugar qualquer.
Porquanto, na vida há dois tipos de fracassos:
o da inconsequência juvenil,
inconscientemente amoral;
um tipo de fracasso que não lhe intimida nem ensina nada;
uma espécie perdoável,
atribuindo-lhe falta de juízo,
motivo de mangação.
Todavia, o fracasso do velho parece imperdoável,
atribuindo-lhe inconcebível imaturidade
e até mesmo falta de caráter,
algo que o pune,
açoitando-lhe a mente
e que deixa marcas indeléveis na alma
até o tempo que lhe resta,
quem quer que seja ou tenha feito.
Não são mais reles ferimentos;
são chagas que nunca cicatrizam.
Aqui na terra se paga dirão muitos.
Não se espera a justiça divina.
Assim é a justiça dos homens;
implacável e frágil como eles mesmos.
Eis que de nada vale mais um homem de coragem vazia,
Arroubos de valentia,
bravatas,
gritaria.
Tantas batalhas sem sentidos,
trabalho improdutivo e hedonismo,
na direção de um beco sem saída;
é bola perdida.
Um dia sua coluna vergou,
O cabelo embranqueceu,
A vista escureceu,
A pele secou,
A perna tremeu.
Sua consciência embotou,
Então, seu coração arrítmico pranteou em cântaros até secar no deserto.
E olhou para trás, entristecido, no caminho,
só viu terra arrasada;
o que plantou pouco vingou,
Ele colheu as provas contra si, ele as analisou usando todos os recursos e atenuantes,
ele as julgou procedentes e declarando-se culpado se condenou sem mais apelações ao degredo de sua consciência.
E adiante, atônito, olhou para terra infecunda e sem futuro.
Desesperado, chorou.
Um dia acordou tarde!
Pensou: “Não dá para voltar no tempo,
não dá mais para lutar lutas passadas,
não há sentido a revanche,
não dá mais para corrigir os erros”.
Foi um tempo perdido.
Perdeu o prumo!
Acabou vencido,
acabou seu crédito,
acabou o seu tempo,
Acabou perdido.
Todos se foram
Saldo negativo.
Nenhum mérito.
Na partida final,
na longa estrada da vida.
está sem bússola,
sem destino.
As cortinas cerraram
As luzes fecharam.
Amanheceu o dia.
Aliviado, pensou:
isso jamais!
Sou como São Dimas na cruz.
Assim, disse ele para si mesmo:
“Ainda dá para corrigir os meus erros.
Refazer minha vida.
Recomeçar.
Basta querer.
Sim, é possível encarar outras lutas.
Não estou morto!
Ainda há tempo para endireitar o rumo das coisas.
Sempre haverá uma solução.
Sempre haverá o perdão
Renascerei”.
Ainda há tempo para a realização do ser humano;
nunca é tarde para ser feliz!