O AMIGO*
O AMIGO
Texto por Paulo Rebelo
MEU AMIGO,
Eu desejaria te dizer algo importante guardado há muito tempo comigo e por algumas dessas coisas estranhas que acontecem na vida, jamais pude te expressar pessoalmente. Nunca é tarde. Então, o que agora te direi fará jus à nossa longa amizade.
Como alguém mais velho do que eu, saiba que tu foste uma espécie de fonte longínqua de profunda inspiração para mim. Algo próximo de um modelo. Eras uma espécie de farol à distância e no meio de uma tormenta, tuas palavras, um bálsamo, um refúgio. Foste um tipo irmão mais velho que nunca tive, mas que, muitas, vezes desejei ter.
Não me recordo de tu teres me aconselhado uma única vez, muito menos fazendo me intermináveis sermões, exceto tecendo comentários positivos e alvissareiros sobre assuntos observados no cotidiano de nossas vidas. Eu, bem mais novo que tu, te escutava atentamente.
Jamais te vi destratando alguém. E ainda que indignado com a algo, mantinhas o equilíbrio, a serenidade, a fleuma.
Eu, por outro lado, jovem, oscilando entre o temperamental e apático, era imaturo e portanto, meus problemas sempre pareciam enormes para suportar. Ficava perturbado e as coisas assim só pioravam.
Muitas vezes, parecia q eu estava sem bússola e naufragando. Nessas horas, como precisei de um “guia espiritual”! Então, recorria a ti e na impossibilidade, à tua imagem etérea e virtual como um teu avatar que se materializava diante de mim. E então, te perguntava: “o que farias se estivesses no meu lugar?” E assim, acredite, sem que dissesses uma só palavra, com receio de te “desapontar”, buscava acautelar-me diante uma situação delicada, pois assim agirias com serenidade, sem precipitação.
Por isso, sem que tu soubesses, meu amigo, te elegi meu irmão mais velho. Tenho certeza que tu aceitas, não? Houve outros raros irmãos… Também, nunca lhes isso.
Por conseguinte, nesse momento, é necessário fazer uma “reparação histórica”, dizendo-te da importância de ter tido um amigo oculto como tu, alguém a ser observado de perto, a ser mimetizado no comportamento e em ação exemplares, algo como espelho com o qual conversei solitário e silenciosamente, muitas vezes, imaginando ser a tua pessoa em carne e osso diante de mim e assim, depois de termos “conversado longa e objetivamente”, seguir adiante, agora claramente mais calmo e seguro.
Enfim, muito obrigado!
Até outro dia, meu amigo.
Paulo Rebelo, o poeta médico 2017.