A ARTE LITERÁRIA DE PAULO REBELO*

A ARTE LITERÁRIA DE PAULO REBELO

(as razões para eu escrever)

A vontade de escrever aconteceu quando eu ainda era acadêmico de medicina. Observava, sem poder me manifestar publicamente o sofrimento pacientes e familiares; eu era apenas um assistente durante aquela aula. Não eram meus os pacientes. Era doloroso. Então, foi por pura necessidade de expressar meus pensamentos e sentimentos diante de tanta dor alheia, que passei a escrever, silenciosamente. Inicialmente, eram apenas anotações de frases curtas, que lidas fora de contexto não faziam nenhum sentido. Eram notas aleatórias e confusas, refletindo aqueles momentos. Anotava para relembrá-las um dia. Havia muito mais emoção do que razão.

Foi quando me tornei médico e passei a ter meus próprios casos clínicos, que comecei a escrever com mais frequência. A intensidade e profundidade dos textos vieram com o tempo à medida que eu amadurecia e passaram a ter sentido.

“Ao longo do tempo tendo assistido tanta dor alheia, acabei por me tornar a própria dor ambulante”.

Até hoje os meus textos são válvula de escape, uma catarse; é o meu RIVOTRIL. Não dá para suportar tanto sofrimento sem um “antídoto”; a escrita é a panaceia. Não escrevo para agradar nem ofender ninguém.

Pareço ter vivido 150 anos na face da terra e ainda viverei outros mais, pois escrever parece uma missão que transcende minha própria vontade; a arte literária me transformou num homem melhor. Antes de falar, escrevo! Ajudou-me a dar sentido ao meu pensamento e equilíbrio às minhas emoções. Agora não explodo mais como quando jovem. Apago antes o incêndio escrevendo, rasgando/rasurando o texto e reescrevendo até sair como sinto um fato ou eu deveria dizer algo, contornado a ansiedade, a tensão e o nervosismo cada vez menores com o passar do tempo.“

Já vi quase tudo que Deus o diabo tinham para apresentar a um homem comum como eu na face da terra”. Já vi muitas coisas através dos olhos alheios e vivi a dor na pele de outrem, eis que nunca perdi um filho, a mãe ou a esposa, por exemplo”.

Assim, como eu já senti incontáveis vezes o sofrimento alheio, tive uma pálida ideia do que é perder alguém que se ama muito e somado às minhas próprias agruras, tornei-me um exímio “expert em dor humana”. Isso está explicito nos textos.

Aprendi a respeitar mais o indivíduo, buscando não julgá-lo e ter empatia por ele. São três dramáticas situações, que irei comentar a seguir e a partir delas, involuntaria e inconscientemente, fui aprendendo a me preparar para o futuro. Antes te direi algo impressionante; diante da morte, já testemunhei ateus, agnósticos e “à toas” pedirem perdão a DEUS, creia-me.

As situações cruciais na vida de um homem e que são um “turning point” a que me refiro são:

✅ a cronicidade desgastante física e emocional de uma doença, por exemplo, Insuficiência cardíaca, Insuficiência renal;

✅ a incapacitação física permanente como surdez, cegueira a perda de um membro, a hemiplegia com profunda deficiência e dependência de terceiros;

✅ por último, o indivíduo diante da inexorabilidade da morte como num câncer com metastase.

A experiência pessoal dessas pessoas é reveladora. Diante delas sou um arguto observador, mas não exatamente passivo; através da arte da medicina, Deus, o arquiteto do universo me outorgou “poderes mágicos”; posso intervir no seu destino crurando-os ou, simplesmente, aliviando seu sofrimento através da empatia, acolhimento e palavras como um bálsamo. Isso me tomou quarenta e tantos anos de aprendizado numa troca intensa e profunda de emoções, que somente a relação médico-paciente pode prover. Sem demagogia, sigo aprendendo. Sou um privilegiado, pois a medicina me deu a enorme capacidade de intervir no destino de alguém; dar-lhe a cura ou aliviar o seu sofrimento.

Assim, considero o meu consultório, metaforicamente, como se fosse o Templo do Oráculo de Delfos, aonde o peregrino (leia-se, paciente) se dirige e após ser ouvido (entenda-se anamnese e exame físico), pergunta ao Oráculo: “qual é o meu futuro?”, “Há uma saída para o meu caso?” A diferença entre o Oráculo e o médico é que este além de intervir no corpo e na mente do indivíduo, ele lhe dá ao paciente o que ele mais deseja: esperança de cura.Estranhamente, muitas vezes me via nessas pessoas. Eu poderia ser qualquer uma delas amanhã.Assim, lentamente, nasceu os primórdios de minha obra literária. É minha própria redenção. Há uma autobiografia escondida nas entrelinhas. A maturidade deu a dose certa entre a razão e a emoção, ficção e realidade.Agrupei os poemas num segmento, que cunhei como “As dores da alma”, que faz parte de uma trilogia: “As Dores do Corpo” e “As Dores do Mundo”, ainda a serem publicadas.A minha arte literária, então, advém de três feridas não cicatrizadas:

✅As dores da alma,

✅As dores do corpo

✅As dores do mundo.

Talvez, a minha autocura esteja nela. As dores da alma são textos de cunho existencial como o abandono e a morte; as dores do corpo são sobre os casos clínicos propriamente dito e por último, as dores do mundo abordam as complexos e contemporâneos assuntos como a legalização das drogas, a descriminalização do aborto e etc. A respeito da figura na capa do livro, quem vê o indivíduo cavalgando num cavalo em direção ao horizonte à procura da razão, de antemão, sabe que lá não a encontrará. Por que não? Àquele que crê em Deus e tem fé a razão está no CRIADOR. A despretensiosa resposta parece estar nos textos e poemas existenciais que escrevi, reflexos do que vi e vivi como médico.O livro a ser publicado “A GALOPE: em busca da razão” não é um livro esotérico, místico, religioso, espírita nem de autoajuda; é um livro profundamente existencial onde através dos textos, o leitor vai ao encontro de si mesmo.Um forte abraço!Paulo Rebelo , médico escritor e poeta.

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