PERSONA NON GRATA*

PERSONA NON GRATA
Por Paulo Rebelo

Acredite, já fui visto como persona non grata ao opinar sobre o Programa Mais Médico e, por conta disso, a porta da amizade com alguns se fechou.

lembrei-me da seguinte história a seguir, agora que o Lula afirmou que, se eleito, pretende trazer a brigada de médicos cubanos de volta ao Brasil, algo vívido na minha memória a aceitação de parte expressiva da sociedade brasileira, notoriamente, a classe média simpatizante do “socialismo”.

Em Brasília, durante um lauto almoço de confraternização de domingo entre familiares e pessoas muito proximas, e outras nem tanto, numa grande mesa, um senhor que não conhecia, já na casa dos 70 anos, ao saber que eu era médico, perguntou-me o que eu acha de tal programa petista.
Naquela época (2013), o Brasil estava muito dividido quanto à presença desses profissionais estrangeiros, pois envolvia protestos das associações de classe médica e até o Ministério do Trabalho, pois 70% da bolsa de 11.850,60 reais, leia-se salário, paga aos médicos cubanos, era repassado ao governo cubano via OPAS (Organização Pan-americana da Saúde). Prevaleceu o jeito petista por “razões humanitárias”.

Sabendo que entraria numa bola dividida, respondi que seguia as diretrizes do Conselho Federal de Medicina; o médico cubano deveria estar regularmente registrado no Brasil.

Insatisfeito com a breve resposta, perguntou-me diretamente se eu era contra ou a favor do médico cubano.

Militar graduado da reserva da aeronáutica, homem de modos rudes, temperado pelo cargo de alta patente militar, sem esperar resposta, diante de sua plateia, passou a fazer preleção para todos ao redor em alto e bom tom que:

● o médico cubano era mais humano que o brasileiro;
● o médico cubano era mais patriota que o brasileiro, pois sem reclamar, ia para os rincões do país, onde nenhum médico brasileiro queria ir;
●o médico brasileiro era “mercenário”;

(Eu já estava constrangido, nessa hora, passei a ficar indignado, mas mesmo tenso, ainda assim mantive o equilíbrio.

Continuou dizendo que:

● o médico brasileiro era “mafioso”.
● o médico brasileiro “puxava uma cachorrinha!”

Alguém perguntou: “o que é que é isso, coronel?”

Disse com ar de deboche: “tá na m€rd@, subempregado por aí!”

Protestei: “de onde o senhor tirou esse absurdo?!

O povo arregalou os olhos, antevendo um embate entre ele e eu.

Não satisfeito, disse:

● o médico é um “garimpeiro”. Outro galhofeiro bajulador, rindo perguntou: “por que coronel?

Ironicamente, concluiu: “o cara só vai para onde dá para cavar dinheiro!” Risada geral.

Pronto, entornou o caldo!

Aqueles que me conhecem bem, sabem que busco discrição e evito a todo custo problemas, todavia (sem bravatas), não fujo ao embate se for por uma boa causa e ao final, engrandecedora. Esse era o momento.

O ambiente não mais era sério; era muito desagradável estar naquela roda, mascarada pela pose de fina estampa daquele sujeito, destoando com local tão belo e aprazível.

Assim, indignado, enveredei pelo mesmo escárnio às suas declarações estapafúrdias e desrespeitosas.

Naquele dia, estavam comigo Bernadete Rebelo e nossos três filhos já médicos e as duas filhas menores, que já pensavam em ser médicas como os irmãos. Acompanhando tudo à meia distância, Bernadete, olhando-me aflita com o ar severo de reprovação, balbuciava por linguagem labial- “sai já dai!”

Era tarde demais.

“O senhor é militar brasileiro ou um espião cubano? O senhor já consultou com algum médico cubano? Aposto que não, pois deve ter o FUSEX e consulta nos melhores hospitais e médicos em Brasília.
O senhor deve ser um traidor do Brasil “, disse eu.

Fechou o tempo. Disfarçando, um e outro acovardado, que incentivam o velho militar, logo deixaram a mesa. Não teve o pessoal do “deixa disso”. Quem ainda ficou me escutou dizer-lhe, que “jamais havia me sentido tão desrespeitado”. Com jeito “blasé”, fez pouco caso; nada disse. Nem houve um nenhum pedido de desculpas pela grosseria.

“Aquela senhora ali que nos olha é médica pediatra, minha esposa; temos três filhos médicos. Isso não é para qualquer um” e arrematei: “esse programa é um enorme tapa-buracos, escondendo a falta de postos de saúde adequados, medicamentos e equipamentos médicos nos interiores.

A Bernadete, muito educada, célere se aproximou da mesa e mantendo a fleuma, disse: “amor fiz um prato bem quentinho para ti. Vamos? O senhor nos dá licença?” O velho já estava bufando, mas teve que retroceder. Ao que fulminei dizendo, já de pé ao seu lado, dando-lhe um tapinha nas costa:

“eu nunca tinha ouvido tanta m€rd@ na minha vida!”.

Paulo Rebelo, médico.

P.S. Durante dias, fiquei com um nó preso na garganta, pois essa é a massa “sofisticada” de eleitores de LULA, que a despeito do grandioso trabalho do médico brasileiro (cerca de 850 deles faleceram) durante a pandemia da COVID-19, no fundo, lamentavelmente, ainda não apagou a imagem negativa do médico brasileiro, ao simpatizar com o retorno dos médicos cubanos, demonstrando crassa falta de apreço, respeito, empatia e consideração por esse profissional.

A presença do maior contingente de médicos estrangeiros já vistos no Brasil, coincidiu com as epidemias de Dengue, Chikungunya e Zika virus, confirmando que os graves problemas de saúde pública são decorrentes da falta de investimentos econômicos e gestão, e não pela falta de médicos.

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