O ROUBO*

O ROUBO

Eu nunca quis

Economizar com a paixão.

Meu coração

Era como uma tabula rasa,

Outrora, imaturo e virginal.

Desfazia-se em sorrisos,

Rasgava-me de alegria

E numa gostosa dor pungente

Que anestesiava.

Era um misto de amor bruto

E celestial.

Uma droga que hipnotizava.

Não havia limites nem pudor

Nesse amor seminal.

Algo insano,

Angelical.

Quis fazer de meu coração

Uma porta escancarada,

Passe livre,

Sem senhas;

Apenas que me amassem,

Que nem eu mais sabia

Que tal porta existisse.

No amor, estava completamente

Entregue à própria sorte.

Então, geralmente, à noite,

Quando todos os gatos são pardos,

Sorrateiramente, muitas ladras

Na forma de anjos e sereias

Entravam e saíam

Tantas vezes de meu coração,

Que aos poucos,

Sem que eu percebesse,

Ele foi sendo roubado e dilapidado,

Que o amor perdeu o viço.

Assim, perdeu a razão,

Enlouquecido,

Até um dia quedar

Sozinho na solidão,

Perdido nas lembranças

Do tempo,

Quando o meu coração

Era a mais pura emoção.

Paulo Rebelo, o escrevente do tempo.

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