O ORÁCULO*
O ORÁCULO
Já vivi
Cento e cinquenta anos
Na face da terra
E até morrer terei vivido
Outros tantos.
Através de corpos alheios
Vivi muitas vidas,
Como médico senti
Suas dores.
Vi maravilhas
E horrores.
Há tanta experiência Acumulada
Que tornou-se indistinta
De minha própria.
Então, me perguntas
De onde vem
Minha experiência de vida
E dela uma certa atitude blasé,
Como se eu soubesse Antecipadamente
Do que virá e seu desfecho,
Parecendo seguro
Quanto à natureza
Dos acontecimentos?
No fundo,
Não tenho certeza alguma;
Vem de minha resignação,
O fato de que a vida
É uma sucessão
De incertezas e assim
Parece que nada
Me surpreende mais,
Tudo já é chegado ao fim;
É questão de tempo.
Aos poucos,
Tornei-me o oráculo,
Onde lá enfermos
Querem saber
O seu futuro,
O confessionário
Onde externam suas culpas
E arrependimentos,
O túmulo onde lá
Se enterram todos os segredos De seus mundos!
Assim, eis o meu testemunho:
Já presenciei
E vivi na pele quase
Tudo que DEUS e o diabo
Teriam para apresentar
Na face da terra
A um só homem.
Paulo Rebelo, o médico poeta.