OUTRA VIDA*

OUTRA VIDA

Um dia

Acordei 

Querendo ter sido

Diferente. 

Imaginei

Que pudesse outro ser,

Como se nunca tivesse existido.

Insatisfeito,

Como se fosse possível

Mudar meu jeito 

Como quem muda 

De casa,

Cidade,

De leito.

Que pudesse, 

Pois Deus apagar os vestígios 

De quem sou

Ou fui um dia,

Dado tanta dor,

Tantas perdas,

Feridas,

Tanto sofrimento,

Decepções

E mentiras.

Não haveria mais memórias 

Para condoer-se,

Das dores que sofri.

Portanto, não haveria 

Mais a vergonha,

De lutas inglórias

Que perdi.

Desapareceria a tristeza,

Talvez, quem sabe,

Pediria a Deus apenas 

Que restasse 

A suave dor da saudade

Que a levaria comigo

Na nova chance de vida,

Para a eternidade.

Surgiria, então, 

Uma nova criatura

Sem defeitos de fabricação,

Pura.

Assim, 

Não existiria mais EU,

Haveria um outro ser.

Não mais sofreria tanto.

Haveria um novo código genético,

Seria um como encanto.

Configurada para o amor.

Nasceria uma alma

Já vacinada,

Do pecado original imunizada,

Isenta da dor.

Paulo Rebelo, o médico poeta.

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